"Vivo da floresta, protejo ela de todo o jeito, por isso vivo com a bala na cabeça a qualquer hora, porque vou para cima, eu denuncio. Quando vejo uma árvore em cima do caminhão indo para uma serraria me dá uma dor. É como o cortejo fúnebre levando o ente mais querido que você tem, porque isso é vida para mim que vivo na floresta e para vocês também que vivem nos centros urbanos."

Zé Claudio, assassinado em maio de 2011.



terça-feira, 1 de maio de 2012

A saga da Juréia

A Estação Ecológica Juréia Itatins foi criada em 1987, abrange uma área que inclui os municípios de Peruíbe, Itariri, Miracatu e Iguape e resguarda remanescentes de mata atlântica, manguezal, restinga, praia e costão rochoso.
 
 
Praia do Caramborê, pertence a área de reserva e divide a praia da Desertinha da Barra do Una.
( uma pequena amostra do paraíso)
A questão é que muitos anos antes de ganhar o status de Estação Ecológica, toda a área de mais de 79 mil ha já era preservada e ocupada por populações locais que não interferiram no ecossistema, nem alteraram drasticamente esse meio. Há pessoas com mais de 80 anos que nasceram e residem até hoje por lá.
 
 
São mais de 300 famílias e 12 comunidades adaptadas aquele ambiente, que não pretendem, nem nunca pretenderam evadir do local. Entendem que possuem o direito de viver lá. Direito este, que eu também considero legítimo.
 
 
Acontece que o Governo de São Paulo, através da Fundação Florestal (orgão da Secretaria do Meio Ambiente) pretende realocar essas famílias, para implantar um projeto que pretende reestabelecer a Estação Ecológica.
 
 
Você pode estar achando estranho eu não concordar com uma iniciativa que prevê a conservação de uma estação ecológica. Mas nesse caso, estou contra o realocamento dessas pessoas, por vários motivos.
 
 
É engraçado como nesse país,  homens que destruíram áreas imensas de diferentes biomas, para criar gado, plantar soja ou cultivar qualquer outro alimento em sistema de monocultura, que ganharam milhões exportando seus produtos e em nenhum momento pensaram na sustentabilidade do planeta, ainda conseguem o privilégio de não pagar pelos seus crimes, através de uma anistia que perdoa criminosos ambientais, e mais que isso, o direito de desmatar ainda mais. Enquanto populações que vivem há décadas, sem causar impactos, sem dizimar espécies sejam obrigadas a sair de suas casas e de sua terra.

Eike Batista, enquanto maior bilionário do Brasil, comprou milhões de metros quadrados e não desistiu da construção de um porto em Peruíbe. Alheio aos impactos ambientais e completamente indiferente aos direitos dos índios e das populações locais. O petróleo fala mais alto que qualquer brasileiro.

No Rio de Janeiro, Sérgio Cabral chegou a alterar a legislação ambiental, para beneficiar Luciano Huck, que burlando as leis construiu um mansão em plena reserva em Angra dos Reis. Isso pode.


Essas famílias não querem esses privilégios, garantidos apenas às elites criminosas. Essas famílias querem o que lhes é de direito. A manutenção e preservação de sua cultura e estilo de vida. O direito de permanecerem onde nasceram. O direito de viverem integrados a natureza. Fazendo parte do ecossistema. Resguardando sua floresta.

Elas querem o direito de continuar em suas casas! E não a obrigação de abandonar os seus lares para morar em conjuntos habitacionais, construídos e superfaturados pelo governo, que em época de eleição há de exibir esses dados, para convencer a massa de que está trabalhando para o bem do povo.

Essas famílias tem o direito de dizer NÃO à vida urbana. Dizer não aos bairros periféricos para aonde querem realocá-las. Dizer não aos subempregos. Dizer não à violência e a hipocrisia! Dizer não a integrar as estatísticas que indicam a insatisfação de quem mora nas cidades.

Se o governo e o orgão ambiental desejam a conservação da reserva, que desenvolvam programas sócio ambientais, que integrem comunidade e floresta. Que gerem empregos sustentáveis, assim como acontece em Ubatuba, com o juçaí (projeto desenvolvido pelo IPEMA, com supervisão do Ministério do Meio Ambiente). Que fiscalizem! Que não permitam desmatamentos, especulação imobiliária e turismo predatório.

Seres-humanos também fazem parte do meio ambiente. Afastar as pessoas da floresta e promover educação ambiental nos meios urbanos não me parece muito lógico. Despejar nativos e permitir a permanência apenas de técnicos e cientistas, não é muito democrático também, para não dizer elitista.

E que não transfiram a dívida de 500 anos de retrocesso ambiental a essas famílias. É injusto que os moradores da Juréia,  paguem, sozinhos, o preço pelo descaso secular que o homem teve com a natureza! Não foram eles que dizimaram a mata atlântica. Eles também desejam continuar vendo a floresta em pé. E eles merecem esse direito!

Até porque se a reserva chegou intacta até os anos 80, não foi pela ação dos políticos, especialistas, especuladores imobiliários, construtores ou qualquer outra pessoa graduada que vive do lado cinza dessa história.


Mais informações:





2 comentários:

Carolina Daemon Oliveira Pereira disse...

Eu morei na Juréia, conheci aquele povo. Aqueles caiçaras não são santos, vai por mim...

Mariana MT disse...

Concordo...Mas nenhum lugar é habitado apenas por mocinhos ou bandidos.

Por isso além de discordar da realocação dessas pessoas para os centros urbanos, também sou favorável a fiscalização.

Uma via de duas mãos. Direitos e deveres devem andar juntos.

E se não for possível aliar natureza e ser-humano, estaremos todos perdidos no final...

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